Diferentemente de outras disciplinas, a História traz em seu
bojo questões conflitantes quando ao seu ensino em sala de aula. O que, por que
e como ensinar são perguntas que inquietam e produz uma variedade de opiniões
entre os professores de História.
Não resta dúvida de que o surgimento da História, como uma
vertente do conhecimento científico, viera acompanhado de interesses de
classes. Era preciso algo que legitimasse de forma honrosa, pomposa e hercúlea
a ação dos grandes homens, cujos feitos teriam sido desencadeados pelo mais
nobre sentimento patriótico. Então, coube à História essa função, a de resgatar
os fatos históricos e criar uma história em que se efetivasse a ação de reis,
imperadores, príncipes, chefes de estado e, enfim, de verdadeiros heróis que
com bravura deram a sua vida pela sua nação.
Nesse contexto, a História estaria sempre reproduzindo os
interesses de uma classe em detrimento de outra, considerada a histórica. Assim
foram vistos os negros, as mulheres, os índios, enfim, as massas populares que
por muito tempo a historiografia tratou de excluí-los. Vista dessa forma, a
função da História até pouco tempo nada mais foi do que uma ferramenta
propositalmente utilizada para legitimar uma época, um período histórico, ou
seja, as fases em que, didaticamente, são divididos os desenvolvimentos sociopolítico
e econômico das sociedades.
Na educação, o ensino de História tratou de reproduzir
fielmente as ideologias dominantes. A ênfase dada aos grandes feitos tais como:
o Descobrimento do Brasil, a Proclamação da República, a Inconfidência Mineira,
dentre outros acontecimentos, são exemplos de episódios históricos que deveriam
ser inesquecíveis, servindo de modelos pela bravura e patriotismo dos seus
protagonistas.
O início da década dos anos vinte inaugurou uma nova forma
de produção historiográfica, fruto das idealizações de historiadores franceses,
que ao ampliarem o conceito de fonte, trataram de produzir a História não
apenas tendo como base os documentos diplomáticos. O historiador passou a ser
visto como um farejador de carne humana. Alarga-se os enfoques dados aos fatos,
procurando com isso proceder a uma investigação que também desse conta dos
estudos culturais, o cotidiano, as mentalidades, as mulheres e os demais
aspectos humanos.
Diante dessa metamorfose pela qual passou a História, há um
reflexo de toda essa transformação no campo do ensino da História. A questão
sobre o que ensinar tornou-se cada vez mais premente, conflitante e ambígua.
A sociedade contemporânea, composta de uma sucessão de
tempos, quebra a ideia da continuidade, privilegiando a multiplicidade de
agoras. O aluno, parte integrante desse contexto, também passa da condição de
objeto, assumindo a condição de sujeito da educação. E aí está a questão que
vem se tornando cada vez mais conflitante no processo de ensino-aprendizagem.
Entendida como um meio para se efetivar projetos dos
detentores do poder, a História foi amplamente utilizada com o objetivo de
formar o cidadão. Nessa perspectiva, uma pedagogia política que envolvia vários
segmentos da sociedade foi formulada, atendendo às expectativas desse grupo que
na verdade pretendia criar o cidadão ideal dotado de um certo perfil
sociopolítico e cultural, de modo a se enquadrar nos preceitos da sociedade que
deveria ser criada.
Não faltaram esforços por parte da conjuntura que arquitetava
tal projeto. A Companhia de Jesus, desde a colônia, se encarregou de ministrar
uma educação católico-sagrada, calcada nos interesses do estado. No Brasil
Império, os institutos históricos e geográficos cumpriram, efetivamente, a
tarefa de criar uma identidade nacional brasileira, dando enfoque todo especial
à colonização portuguesa, subjugando o negro e os índios, entendidos como
incivilizáveis e exóticos, respectivamente. Os historiadores desse período não
pouparam tinta no sentido de exaltar a pátria, buscando com isso desenvolver um
espírito altruísta e patriótico na personalidade dos alunos, futuros cidadãos.
Sem dúvida, a História cumpria perfeitamente o papel
político que lhe foi atribuído. O ensino da História, nesse sentido, não via no
aluno um ser crítico, dotado de saberes, artes e conhecimentos construídos a
priori, e que ele, sem dúvida, leva para a sala de aula. A educação não passava
de instrução, na qual o aluno era apenas um receptor de informações, em que ele
nada lhas acrescentava. O papel da educação ficava a cabo do professor, o
transmissor de verdades imutáveis.
Na sociedade contemporânea, percebe-se um alargamento das
discussões acerca do aluno que não é apenas um sujeito histórico, mas também,
um sujeito do cotidiano, aquele que está presente no dia a dia, rompendo
espaços e construindo saberes. Nessa abordagem, muda-se o perfil do aluno
outrora construído, e o professor deve se apropriar de todo um aparato e
cabedal de conhecimento para dar conta das vicissitudes ocorridas na educação e,
principalmente, no campo do ensino da História.
É claro que a História deve caminhar com as questões do seu
tempo, mas o que se deve buscar é uma participação mais efetiva dos sujeitos da
educação na participação crítica e consciente da sociedade. Isso só será
possível se contarmos com uma educação que atenda as demandas da sociedade
contemporânea. A História, nesse sentido, deve ser entendida como uma ciência
em construção e o seu ensino deve dar margem a problematização.
Dessa forma, estaremos caminhando para a legitimação das
finalidades pertinentes ao ensino de História cuja essência deve estar pautada
no questionamento, que na sociedade contemporânea torna-se muito evidente na
postura do aluno.
Weber Gomes da Silva
[1] Licenciado em História pela Universidade Estadual de
Feira de Santana e Pós-graduando em Política e Sociedade pelo Centro
Universitário Barão de Mauá (polo de Feira de Santana).
Redação: Surfando com a Notícia
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